sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Com que roupa eu vou?


Cheguei do trabalho, apressado. Tinha combinado de encontrar uns amigos no bar. Tomei um banho, me arrumei e já ia saindo de casa quando minha mãe perguntou:
-"Você vai jogar bola?"
Como eu já disse, eu tinha acabado de tomar banho. Estava de calça jeans e uma camiseta de manga comprida, nova.
-"Mãe, parece que estou vestido para jogar bola?"
Ela deve ter ficado constrangida, e tentou consertar:
-"Ah, é que você sempre faz isso. Há algumas semanas, você veio em casa e tomou banho antes de sair pra jogar bola. E também foi mais arrumado."
...
Na verdade, eu não jogo bola há uns 2 anos! Ou seja, nessa vez a que minha mãe se referiu, "há algumas semanas", eu também havia ido para casa, tomado banho e me arrumado para sair! Para um bar! Não para jogar bola!

Esse diálogo que tive com minha mãe me fez pensar: "Das duas, uma: ou eu sou um viado, que toma banho e se arruma para jogar bola, ou eu me visto mal pra caralho!".

Obviamente, a primeira alternativa está descartada. Quer dizer: na cabeça da minha mãe, eu não sei. Mas eu garanto: ela não procede! Já a segunda opção tem bastante fundamento!

Em toda a minha vida, eu usei terno apenas 3 vezes -- pelo menos, só me lembro dessas. A primeira foi na minha formatura da faculdade, aos 23 anos! A segunda, em outra formatura, de amigos. E a terceira, em um casamento -- não queria usar terno, mas era obrigatório para os padrinhos.

Tudo bem, justificar minha conclusão no número de vezes que usei terno pode parecer um exagero. Afinal, entre um terno e uma roupa de mendigo existe uma grande variedade de estilos. Mas também não foram muitas as ocasiões em que usei uma roupa mais social (no meu entender, 'roupa social' é a combinação de uma camisa de botão, um sapato e uma calça que não seja jeans). Isso só aconteceu em casamentos e na apresentação do meu trabalho de conclusão de curso, na faculdade.

Concluindo: se não existissem casamentos e faculdades, eu nunca teria usado um terno. Nem mesmo uma 'roupa social'!

Por falar em faculdade, ela me deu dois grandes ensinamentos sobre o meu jeito de me vestir. Em primeiro lugar, um dos motivos para eu largar o curso de Direito foi o fato de eu não querer ser obrigado a trabalhar de terno. Verdade. A segunda lição veio no jornalismo. Um professor me usou como exemplo em uma atividade. Ele estava falando sobre como descrever uma pessoa ou objeto. "O que poderíamos dizer sobre o Julio? Que ele é um cara tranquilo, sereno e apresenta uma simplicidade indumentária!".
...
Simplicidade indumentária. Se um professor que eu via poucas vezes por semana, há apenas alguns meses, foi capaz de me definir assim, o que podem dizer as pessoas que me conhecem há mais tempo? Eu não tinha dúvidas. Todas concordaram com o professor. E o termo 'simplicidade indumentária' me acompanha até hoje. "Ah, Julio! Mas tá reclamando do quê? Em quatro anos de faculdade, nunca te vimos usando calça! Era sempre bermuda, tênis sem cadarço, camisa surrada. E pra ajudar, nem penteia o cabelo!". Mentira deles! Usei calça uma vez na faculdade! Em um trabalho de teatro. Eu interpretei o Seu Madruga! E a calça fazia parte do figurino!

Recentemente, passei outra situação constrangedora por causa das minhas roupas. Estava em casa, me preparando para dormir. Camisa velha, a combinação "chinelo com meia" e uma calça que comprei no carnaval de São Luiz do Paraitinga, feita com retalhos coloridos. Precisava descer para abrir a porta para um amigo, que ia embora. Pensei: "pô, meia noite. Não corro o risco de encontrar ninguém no prédio"! Grande engano. Abri a porta do elevador e quem estava lá? A vizinha gostosona. Se eu tinha alguma chance com ela, foi-se embora naquele exato momento. E o pior. Ela ainda deve espalhar pelo prédio: "O viadinho do 42 fica com os amigos em casa, até o fim da noite, brincando de 'micareta', se esbaldando num carnaval fora de época!".
Apesar de tudo que já passei, não ligo. Não vou mudar. Tá reclamando das minhas roupas? Poderia ser pior. Você ainda não me viu sem elas...

PS: essa última frase é mentira. Entre as pessoas que já me viram sem roupa, estão algumas das que mais reclamaram do meu jeito de me vestir.

terça-feira, 25 de agosto de 2009

O homem mais sortudo do mundo



Eu tenho rinite. Praticamente não respiro pelo nariz. Mas calma. Obviamente não é por isso que sou “O homem mais sortudo do mundo”.
Mas existe, sim, certa relação. Pois o título desse texto faz referência a uma das pessoas que fazem minha vida ter sentido -- e dão "cheiro" às coisas que acontecem nela.

Sim, apesar da rinite, eu sou o homem mais sortudo do mundo. Afinal, quantas pessoas nascem tendo, a seu lado, o melhor amigo, já pronto?
Tudo bem. Ele não estava literalmente a meu lado. E também não estava exatamente pronto. Com apenas um ano e pouco mais de um mês, ele devia estar em casa. Possivelmente dormindo. E provavelmente nem tinha consciência de que acabara de ganhar um irmão.

É lógico que eu não me lembro do primeiro contato com ele. Eu, com certeza, não disse nada. Ele, talvez, tenha chorado. Mas não por minha causa. E sim por fome.
A memória também não guarda os primeiros anos dessa amizade. Mas as fotos revelam que foram especiais.

Das partidas de futebol me recordo bem.
Primeiro, de botão. A coleção que herdamos de nosso pai – e desperdiçamos, brincando de jogar tudo para o alto. A nossa própria coleção, que tentamos fazer em parceria – e desfizemos, depois de algumas desavenças. E também das vitórias da minha poderosa União Soviética, que tinha a muralha Dasaev (uma mistura de caixinha de fósforo, parafusos e fita isolante), em cima da fraca Romênia dele, do decadente craque Lacatus.

O futebol também ganhava as ruas. E aí, ele era insuperável. Por mais que eu me esforçasse, meu irmão conseguia fazer a bola passar pelo gol de pedras mais vezes. Diferença que só desaparecia quando jogávamos no mesmo lado. Quando, com nossos primos, formávamos o time dos Codazzi. Simplesmente imbatível.

Também sabíamos jogar futebol em dupla. No quarto, apenas com uma bola de tênis e um gol rabiscado na parede. Ou durante uma tempestade, no campinho de um condomínio em Iguaba Grande. Nunca me esqueci de uma defesa que fiz, em cima de uma poça d’água. Engoli barro e grama. Mas salvei aquele gol.

A nossa dupla não brilha apenas no futebol. Ela existe em qualquer campo. Existe apesar de todas as brigas que já tivemos. E existe, principalmente, por todas as brigas que ele já comprou, apenas para me defender.

Já ficamos meses sem trocar uma palavra sequer. Eu já disse coisas que o magoaram. E já escutei algumas também. Mas, quase três décadas depois, nossa amizade continua forte. Intacta.
Talvez eu nunca tenha dito o quanto gosto dele. O quanto ele é importante, e o quanto eu me orgulho de tê-lo como meu irmão. Mas acho que isso nem é necessário. Afinal, já éramos os melhores amigos antes mesmo de aprendermos a falar.

Uma vida em um dia

30 de julho. Como eu esperei por esse dia.
Depois de mais de uma semana, íamos nos reencontrar. Eu estava bem empolgado! Mas tudo mudou na véspera, depois de um telefonema. Você não disse quase nada, apenas chorou. E apesar das poucas palavras, eu entendi perfeitamente o que queria falar.

Os planos haviam mudado. Em vez do show de blues, íamos nos encontrar em casa. Um último encontro.

Foi difícil dormir. Tantos sonhos ruins. Mais difícil ainda foi acordar, e ver que a realidade era pior.
Antes, eu queria que a noite do dia 30 chegasse mais rápido. Agora, queria poder parar o relógio. No trabalho, nada fiz. Apenas procurei algo que me distraísse um pouco.
O relógio não parou, e quando vi, já era hora de ir embora. Peguei carona e desci um pouco longe de casa. Caminhar me fez perceber que tudo aquilo que eu queria evitar era apenas uma questão de tempo.

Pouco depois, já em casa, o telefone tocou. Era você.
Ao nos encontramos, nenhuma palavra. Apenas um abraço.
Vários minutos se passaram até que conseguíssemos começar a conversa. Você me explicou seus motivos -- razões que eu já conhecia. E contra as quais eu não podia fazer nada.

Já estava tudo resolvido. Por isso, as horas seguintes foram de pouco diálogo. Deitados, abraçados. No mesmo lugar que antes fazíamos planos, agora nos desfazíamos deles.

O tempo passou. Aquele abraço -- o último – chegou ao fim. Foi triste. Pois, apesar de saber que tudo mudaria dali em diante, era bom sentir você comigo. A meu lado. Era até possível esquecer que aquilo tudo estava acontecendo.

Mas estava. Aconteceu. Nos despedimos. Você foi embora, de verdade.

Passei a pensar no que iria fazer da minha vida. Afinal, ela continua.
O primeiro objetivo era bem simples: consertar minha bicicleta. Outros podem demorar um pouco mais, como aprender a tocar violão e escrever um blog.
Lembrei também que essa não é a primeira vez que passo por isso. E que todo fim é a chance de um novo começo. Se antes minha vida já estava escrita, agora ela se tornou um livro com páginas em branco. E só eu posso reescrevê-lo. Em preto e branco. Colorido. Tanto faz, só depende de mim.
E é isso que vou fazer. Em breve. Assim que o dia 30 de julho acabar.